Conhecido por suas colunas em várias revistas, na rádio CBN e no programa “Fantástico”, da TV Globo, o administrador de empresas e conselheiro do universo corporativo, Max Gehringer, também resolveu falar sobre outra paixão: o futebol.
Nas coleções “A grande história dos Mundiais”, dividida em sete volumes, Gehringer revela sua coleção de todo tipo de informação sobre as Copas do Mundo e resgata histórias de bastidores sobre as edições do torneio, de 1930 a 2006.
Os Mundiais são descritos com base no contexto político e social dos países-sede e na trajetória das seleções campeãs. Em entrevista à IMPRENSA, o autor falou sobre a produção das obras, os momentos mais surpreendentes e como avalia as críticas sobre o evento deste ano.
IMPRENSA – Quando você decidiu escrever os sete volumes de “A grande história dos mundiais”? Qual foi o critério que utilizou para selecionar os temas abordados?
Max Gehringer – Este é um trabalho de garimpagem sistemática que já tem mais de 20 anos. A primeira pesquisa que fiz, mais por curiosidade, foi sobre a Copa de 1930. Tentei descobrir como as seleções haviam chegado a Montevidéu. Numa era pré-Internet, isso era um trabalho mais árduo do que hoje possa parecer. Era preciso descobrir arquivos de jornais em bibliotecas e consultá-los página a página, o que demandava um tempo enorme. Mas as descobertas que fiz me interessaram o suficiente para continuar procurando. Tentei também buscar fatos interessantes sobre todas as Eliminatórias, que são largamente ignoradas no Brasil.
Tentei descobrir como as seleções haviam chegado a Montevidéu. Numa era pré-Internet, isso era um trabalho mais árduo do que hoje possa parecer. Era preciso descobrir arquivos de jornais em bibliotecas e consultá-los página a página, o que demandava um tempo enorme.
Quanto tempo você levou para produzi-los?
Ainda não terminei, e não creio que irei terminar algum dia. Arquivos virtuais de jornais e revistas têm aparecido cada vez com mais frequência, no Brasil e no exterior, e sempre trazem novidades. Desde o começo, tive duas preocupações. A primeira foi descobrir fatos sobre todos os países participantes, e não apenas sobre o Brasil. A segunda foi procurar checar, em material da época, fatos que hoje rolam na Internet como verdadeiros, dada a repetição constante. Até com certo desprazer, descobri que muitos desses fatos foram puras invenções de cronistas. Para mencionar alguns, o centromédio brasileiro Fausto não recebeu uma consagração da imprensa internacional em 1930, Leônidas não marcou um gol sem a chuteira em 1938, e nossa seleção não saiu desacreditada do Brasil em 1958. Uma pena, porque as lendas são melhores que os fatos reais.
Para mencionar alguns, o centromédio brasileiro Fausto não recebeu uma consagração da imprensa internacional em 1930, Leônidas não marcou um gol sem a chuteira em 1938, e nossa seleção não saiu desacreditada do Brasil em 1958. Uma pena, porque as lendas são melhores que os fatos reais.
Nos livros, você detalha fatos importantes que marcaram os cenários político, social e cultural dos países envolvidos nos mundiais. Há alguma história que marcou mais?
Cada ciclo de 4 anos ano sempre encontra o Brasil cheio de novidades. Cito duas. Em 1994, a seleção viajou para os Estados Unidos com trocentos mil por cento de inflação e quando retornou, dois meses depois, a inflação tinha baixado para um dígito. Não tenho dúvidas de que Fernando Henrique se elegeu presidente na euforia do tetra, e acredito que Getúlio Vargas teria tido uma sobrevida física e política se o Brasil houvesse vencido a Copa de 1950.
Em 1994, a seleção viajou para os Estados Unidos com trocentos mil por cento de inflação e quando retornou, dois meses depois, a inflação tinha baixado para um dígito. Não tenho dúvidas de que Fernando Henrique se elegeu presidente na euforia do tetra
Qual Copa foi mais surpreendente para você?
Historicamente, a de 1954, embora eu não a tenha vivido. Havia na Europa a certeza de que a Hungria venceria, e o Brasil acabou sendo contaminado por esse favoritismo húngaro, tanto que não se achou em campo ao enfrentar a Hungria. A vitória alemã na final é justamente considerada como um milagre, porque os próprios jornalistas alemães, em uma pesquisa antes da Copa, não acreditavam que sua seleção passaria das quartas de final. Para nós, a surpresa mais dolorosa foi a de 1966, porque todo mundo por aqui estava certo de que o Brasil venceria com um pé nas costas. Acabamos caindo já nas oitavas, e até hoje se escreve que Portugal eliminou o Brasil na base da pancada, quando o vídeo do jogo mostra o contrário – o Brasil cometeu mais faltas que Portugal e foi derrotado porque os portugueses jogaram muito melhor, e porque Pelé foi escalado sem ter condições clínicas para jogar.
O que acha das críticas sobre a Copa do Mundo no Brasil?
Esta é a primeira Copa que vejo em que as notícias não são sobre a preparação da equipe, o perfil dos jogadores, ou o sistema tático a ser adotado. Nove de dez notícias versam sobre superfaturamento de obras, má administração, uso desordenado de dinheiro público, e mais uma penca de coisas ruins. A enxurrada de críticas tirou o foco do que uma Copa realmente é – uma exibição de talento futebolístico. Creio que isso mudará um pouco assim que a bola começar a rolar.
Como avalia a preparação do país para sediar o Mundial? Acha que o cenário é semelhante ao ocorrido em 1950 em relação aos atrasos das obras?
Praticamente igual. Em 1950, o único estádio que estava pronto quando a Copa começou era o do Pacaembu, que havia sido inaugurado em 1940. O Maracanã e todos os outros ainda estavam em obras, embora a imprensa brasileira tentasse esconder essa realidade, concentrando-se mais na melhoria da imagem que o Brasil conseguira aos olhos do mundo. Ou seja, nada muito diferente do que está acontecendo agora. A diferença é que em 1950 o Brasil teve quatro anos para se preparar e em 2014 teve sete, mas o tempo mais longo não foi suficiente para eliminar ou diminuir as trapalhadas.
Que tipo de legado a Copa do Mundo de 2014 vai deixar para o país?
Daqui a vinte anos, os livros que contam a história das Copas vão mencionar apenas o que ocorreu dentro do campo. Todo o resto, que hoje rende tantas notícias, será esquecido. O exemplo do Pan de 2007 é típico. Todo mundo sabe que muito dinheiro foi torrado, mas quase não se fala mais nisso. De qualquer forma, alguns dos novos estádios construídos para a Copa certamente se transformarão em monumentos perenes ao que não precisaria nem deveria ter sido feito.
Entrevista feita a Alana Rodrigues,
com supervisão de Thaís Naldoni,
publicada originalmente para o
Portal da Imprensa em junho de 2014.