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Escritores como Joyce, Proust e Poe já foram rejeitados por editoras ou censurados por veículos da época e recorreram à publicação independente

A história da literatura seria bem diferente se Marcel Proust ou James Joyce, apenas para citar autores que chegaram às milhares de páginas, ficassem esperando um editor ideal.

Na verdade, eles até tentaram. Aliás, ambos os casos são a prova viva de que, muitas vezes, os editores não fazem por mal.
Com fama de esnobe, amador e até de alpinista social, Proust publicou ele próprio No Caminho de Swann depois de ser fartamente rejeitado, inclusive por André Gide, que acabou classificando sua rejeição, assim que leu o livro editado, como “um dos arrependimentos mais candentes de sua vida” e um “erro grave da Nouvelle Revue Française”, o nome da revista que Gide dirigiu de 1908 até 1914. Em outra das rejeições, Proust recebeu uma carta que dizia qualquer coisa assim: “Meu caro amigo, eu posso estar morto do pescoço pra cima, mas não consigo entender por que um sujeito precisa de 30 páginas para descrever como ele se vira na cama antes de dormir”. Algumas destas cartas, curiosamente, não ficaram inéditas; estão publicadas no livro Rotten Rejections.

Com Joyce a história é um pouco diferente. Antes mesmo de ser publicado em livro, Ulysses já era um romance que suscitava polêmicas. Isso porque alguns trechos estavam sendo divulgados em uma revista de Nova York, segundo a indicação de Ezra Pound, até que a censura norte-americana interrompeu a publicação por conter obscenidades. Em parte por isso, Joyce encontrou muitas dificuldades para publicar seu Ulysses, até que a Shakespeare and Company, hoje a turística livraria que fica à margem do Sena, em Paris, divulgou o romance com algumas tiragens.

Como se sabe, são muitos os motivos que levam uma grande editora a ignorar um escritor, e quase todos os motivos são baseados em critérios subjetivos, o que não deixa de ser digno de compreensão. Sempre foi difícil, talvez até impossível, definir com precisão o que vem a ser um grande livro ou mesmo um livro vendável, já que até o próprio Stephen King, hoje um dos autores mais vendidos do mundo, começou sua carreira financiando as próprias edições, depois que sua esposa recuperou um manuscrito da caixa do lixo, literalmente.

Por outro lado, a história da publicação independente não é apenas uma história de rejeições. Há mais de um motivo para que os autores prefiram publicar por sua própria conta e risco, como é o caso de Edgar Allan Poe, que justifica sua preferência através de uma célebre definição: “Ser controlado é ser arruinado”. No caso da poesia, a publicação independente praticamente se confunde com a sua história. Não faltam exemplos de poetas que, sobretudo no começo da carreira, mas às vezes durante toda a vida, seja por condição ou opção, pagaram seus livros. Ou pediram dinheiro a seus pais, como foi o caso de João Cabral de Melo Neto quando lançou os 300 exemplares de “Pedra do Sono”, em 1944, aos 22 anos de idade.

Não é aleatório ainda que Willian Blake, poeta, tipógrafo e pintor, outro pioneiro da publicação independente e dos livros de artista no século 19, tenha influenciado de maneira tão determinante as gerações da década de 70, de Rogério Sganzerla a Patti Smith, sem dúvida dois artistas que levaram aos extremos a máxima “faça você mesmo”. Afinal escrever não é outra coisa senão isso; um exercício de autonomia e liberdade.

Victor da Rosa é crítico literário. Colabora regularmente com o Diário Catarinense e mantém o blog Notícias de 3 Linhas, entre outros projetos.

One Comment

    • Vivian Schlesinger

    • 11 anos ago

    Confesso que ficaria muito feliz se uma editora batesse à minha porta para brigar pelos direitos do meu próximo livro. Mas que seu texto me faz um pouco feliz, também, lá isso faz, sim.

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